Museu Carlos Pena Filho. Ou uma brisa azul. Por Luiz Otavio Cavalcanti
“Este campo vasto e cinzento, não tem começo nem fim.
Nem de leva desconfia, das coisas que vão em mim”.
Carlos Pena Filho, em Memórias do boi Serapião.
Primeiro, foi Maria Tânia Carneiro Leão. Ela disse que tem trabalhos inéditos e objetos de Carlos. Depois, foi Flavio Chaves. Que defendeu a instalação de um museu para o poeta.
A poesia pernambucana espera esse museu. O Recife e Olinda esperam este museu. O azul espera este museu. O tempo da maresia disse: passou do tempo. A pernambucanidade replicou: Carlos é Pernambuco. E Pernambuco é Carlos. No transitório do crepúsculo. E no permanente das estrelas.
A poesia de Carlos é um artesanato pernambucano. Artesanato da alegria, no olhar a magia do mundo, da mulher e das cores. E artesanato de insubmissão, contra a feiura do fazer, as carências e a desigualdade.
A poesia de Carlos é local. E universal. Borda os caminhos do lirismo. E do moderno. Como Manuel Bandeira visitou a casa de seu avô. Como João Cabral de Melo Neto pintou cores do Agreste. Como Joaquim Cardozo edificou a concretude nas palavras.
Essa coleção de sentimentos e expressões reclamam um espaço. Não só como memória do sentir e do ver do homem do trópico. Mas como testemunho e ato de defesa do patrimônio imaterial de Pernambuco.
E não há lugar mais apropriado para instalá-lo. Olinda. Que é origem e destino da obra do poeta. E, em Olinda, no Centro de Convenções. Que é traço de união física entre o Recife e Olinda. Assim como a poesia de Carlos é conjunção inspiradora entre mascates recifenses e jangadeiros olindenses.
O Museu Carlos Pena Filho é um aceno ao passado. E uma carta ao futuro. Volta-se para o que foi. E diz: vem, na continuidade da beleza e da imaginação. Dirige-se para o que virá. E diz: serás sempre, na pedra perpétua do reconhecimento vivo de Pernambuco.
Eis um trecho da carta de Jorge Amado a Carlos. Ao saber de sua morte, em 1960.
“Carlinhos,
Não, não desejo ir ao Recife, nem mesmo para chorar com Tânia e Otília, para fitar em silêncio a face de Eufrásio, para acariciar a cabeça de Clarinha. Nem mesmo para sentar-me com os amigos, com Rui e Paulo, com Caio e Zé Condé, e para recordar palavras tuas, momentos, histórias, gargalhadas. Nem mesmo para reencontrar-te nas pontes sobre o Capibaribe, no fundo da livraria, no bar, na casa do mestre Gilberto. Porque ainda não pude aceitar a ideia de que jpa não estás.”
Concluo com os versos iniciais do Soneto do desmantelo azul:
“Então, pintei de azul os meus sapatos, por não poder de azul as ruas. Depois, vesti meus gestos insensatos e colori as minhas mãos e as tuas”.
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