Porcos que comem frutos do mar: A carne de 20 Mil dólares e a fome que rasga o peito da humanidade; vídeo. Por Flávio Chaves

  Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc  –  Nas entranhas de algumas fazendas asiáticas, porcos são alimentados com frutos do mar. Não se trata de uma metáfora, nem de uma fábula moderna. É real. Animais sendo engordados com camarões, mariscos, lulas e peixes frescos. O objetivo? Produzir uma carne “limpa”, “delicada”, “pura”, capaz de atingir o paladar de uma elite mundial que paga até 20 mil dólares por um único exemplar.

O vídeo que circula nas redes sociais, gravado com uma produção estética calculada, tenta embrulhar essa realidade com imagens suaves e uma narrativa quase encantada. O repórter descreve o processo com uma espécie de fascínio técnico, como se revelasse ao público um segredo sussurrado da alta gastronomia. Fala da dieta dos porcos, da textura da carne, dos métodos de criação. Cada frase parece escrita para seduzir o consumidor de luxo, quase como uma propaganda involuntária de um requinte que poucos, pouquíssimos, podem alcançar.

Mas por trás de cada palavra dita com leveza, e de cada cena filmada com esmero, pulsa a obscenidade de um sistema que decidiu que um porco merece frutos do mar enquanto milhões de seres humanos seguem morrendo… de fome. É a encenação sofisticada de um escárnio social. Uma festa para poucos, um cemitério invisível para muitos.

O planeta já ultrapassa os 8 bilhões de habitantes. E em meio a essa multidão, quantos terão o direito de provar uma única vez, ao longo da vida, um prato que sustente o corpo e alivie a alma? Quantos, nesse exato momento, estão deitados em calçadas, em barracos, em favelas, com o estômago vazio, enquanto os donos do topo da pirâmide saboreiam carnes de luxo esculpidas à custa da excentricidade e do desperdício?

Os discursos oficiais tentam camuflar a tragédia com expressões técnicas, chamando de “insegurança alimentar” aquilo que é e sempre foi: fome. Fome brutal, real, diária. Fome que tem rosto, nome, endereço. Fome que mata em silêncio enquanto o mundo se acostuma a ignorá-la.

O vídeo, com sua produção meticulosamente coreografada, tenta disfarçar a ferida com imagens bem editadas e uma trilha sonora que mais parece saída de um filme de terror sutil — o terror dos vampiros bilionários que se alimentam do trabalho sangrento do seu semelhante. Cada acorde de música, cada cena de porcos banqueteando-se com mariscos, é um insulto aos que sequer têm uma mesa para chamar de sua.

Enquanto os animais são engordados com iguarias, milhões de pessoas seguem condenadas à invisibilidade, com a alma rasgada pela indiferença pública e pela covardia de gestores que prometem e não cumprem, que discursam, mas não entregam, que posam de líderes enquanto deixam o povo à míngua. Não é apenas desigualdade econômica. É perversão moral. É um escárnio frio, servido em porcelana, acompanhado de taças de cristal, enquanto nas esquinas do mundo a esperança ajoelha-se, com os olhos voltados ao céu, suplicando pela comunhão mais básica e mais justa: o direito sagrado ao vinho e ao pão.

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