Procura-se um culpado pelos juros, mas ele está escondido no Planalto
Charge do Orlando (Sobral em Revista)
Guilherme Fiuza
Gazeta do Povo
A taxa básica de juros do Banco Central chegou a 15%, a maior em duas décadas. E os representantes do governo – os oficiais e os oficiosos – continuam procurando alguém em quem colocar a culpa. Afinal de contas, não fica nem bem para um governo que se apresenta como popular e sempre criticou os juros altos assumir essa mancha na fotografia “progressista”.
A opção preferencial é atirar contra o fantasma de Roberto Campos Neto. Até outro dia, a tarefa era mais fácil. Com Campos Neto na presidência do BC, bastava aos porta-vozes do governo petista gritar aos quatro ventos que ali estava um homem mau, socialmente insensível etc. O próprio presidente da República chegou a insinuar que Campos era uma espécie de inimigo da pátria. Bons tempos. Com a passagem de bastão para Gabriel Galípolo, indicado por Lula, a coisa deu uma complicada.
FALSA CRENÇA – As mentes fisiológicas realmente acreditam que a sucção não deixa rastros e que dá para segurar as pontas no gogó. A discurseira haveria de criar um clima favorável à redução dos juros, sem aquela tecnicidade que sempre atrapalha a boa lenda.
Aí bastaria faturar mais um indicador positivo e correr para o abraço – porque as bombas deixadas pelo populismo sempre têm efeito retardado, e o amanhã não é de ninguém.
Diferentemente do que ocorreu nos estertores da administração Dilma, porém, a política monetária (ainda) não passou a dançar conforme a música populista. E os juros continuaram subindo.
HERANÇA MALDITA – Como não dá para ficar atirando no Galípolo, os porta-vozes governamentais passaram, inicialmente, a duelar com o fantasma de Campos Neto. A insistência nos juros altos seria uma espécie de herança maldita. Um político petista chegou a afirmar que o ex-presidente do BC prefixou a elevação da taxa… Se colar, colou. Mas não colou.
E os ataques passaram a ser difusos contra a instituição do Banco Central. Parte da imprensa desistiu de embarcar na propaganda governista, talvez percebendo que, nessa área de política macroeconômica, a licença poética já foi longe demais.
Restaram algumas vozes do jornalismo oficial insistindo que o BC está errando. A sustentação desse ponto de vista é perfeitamente possível – desde que não se leia a ata do Copom.
HÁ FUNDAMENTOS – Ali está tudo explicadinho, tecnicamente, sobre os fundamentos para a decisão sobre a alta dos juros. E, obviamente, a culpa que o governo procura até no além está no espelho.
A expansão dos gastos públicos segue sendo o principal fator inflacionário – e não se trata mais de uma curva de preços oscilando dentro da meta.
Já teve até executivo de grande banco declarando que, se não for restabelecido o teto de gastos, não haverá como retomar o equilíbrio da política fiscal e o controle saudável da inflação.
TAPAR OS BURACOS – Mas a retórica continua sendo a de que está tudo bem no arcabouço e que o pacote tributário vai tapar os buracos. Mas a política do remendo nunca deu e nunca dará certo. O binômio gastar & taxar mata, mais cedo ou mais tarde, a galinha dos ovos de ouro.
E os economistas que mais sabem disso são aqueles que pregaram o voto no PT, confiando que o amanhã não é de ninguém.
Mas o amanhã chegou, o Brasil está descendo a ladeira, e a responsabilidade deles está na legenda da foto.
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