O Prato da Vergonha Nacional. Por Flávio Chaves
Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc – Há imagens que não precisam de legenda, apenas de coragem para encará-las. A fotografia que circula nas redes sociais, contrapondo o prato farto de um presidiário ao lanche miserável de uma criança em uma escola pública, não é apenas chocante. É simbólica. É cruel. É o retrato nu de um país que perdeu o juízo moral sobre suas prioridades.
Não se trata de negar direitos a quem cumpre pena, trata-se de questionar a lógica perversa de um Estado que alimenta mais quem transgrediu do que quem ainda sonha. Enquanto o cárcere garante três refeições diárias completas, as escolas, especialmente nas periferias, servem suco artificial e bolachas secas como se isso fosse suficiente para uma infância em formação. Não é. Nunca foi.
Essa desigualdade revela uma escolha: o abandono da infância como projeto de nação. O Brasil, em sua indiferença institucional, trata as crianças como uma estatística futura da marginalidade, ao invés de reconhecê-las como sementes de um país possível. O que alimentamos hoje, com comida ou com descaso, define o que colheremos amanhã.
A sociedade que se mobiliza para garantir os “direitos humanos” dos presos, e que bom que esses direitos existam, permanece muda diante da fome emocional, física e simbólica das crianças em nossas escolas públicas. O direito à dignidade não pode ser seletivo. Se um preso tem direito a arroz, feijão, carne, ovo, fruta, por que uma criança não?
Onde estão os que se dizem defensores dos direitos? Onde estão as ONGs? Onde estão os gestores públicos, os secretários de educação, os prefeitos, os governadores? Onde está o clamor do Congresso diante da dieta infantil que mais parece ração do que refeição?
O que se vê é um Estado que não investe em educação porque tem medo de cidadãos conscientes. Prefere formar delinquentes para depois alimentá-los com dignidade no sistema penal. É mais fácil controlar do que educar. É mais lucrativo punir do que prevenir.
Mas há uma escolha moral diante de nós: ou alimentamos a infância com dignidade, ou estaremos alimentando a violência com descaso.
Uma criança que se sente esquecida pelo Estado cresce com a certeza de que o crime é o único caminho que oferece acolhimento, ainda que distorcido. Não é uma questão de opinião, é uma questão de justiça social.
Estamos falhando. Como nação. Como sociedade. Como humanos.
E enquanto o prato de um presidiário continuar mais nutritivo que o de uma criança inocente, não poderemos nos chamar de civilizados. Teremos, no máximo, erguido uma prisão chamada Brasil.
Share this content:




Publicar comentário