A crônica domingueira. Por Magno Martins
É daquelas sertanejas com alma que flerta os lírios do campo. Valoriza a vida, a simplicidade da gente que tem paz fazendo a conexão com a natureza. Que se encanta e se emociona com a beleza do nascer do sol, o canto dos pássaros, a satisfação de plantar e colher. No pomar de nossa choupana em Arcoverde rega as plantas com um sorriso largo.
Como matuto também, do santuário Pajeú das flores, onde todas as almas são de cantadores, entendo perfeitamente a alma sertaneja da minha Nayla. O Sertão é mais do que um lugar, é um sentimento de paz e pertencimento. Como disse João Guimarães Rosa, o Sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar.

Em “Grande Sertão e Veredas”, João Guimarães Rosa, outro gigante que pintou o sertão de todas as cores, fala do encorajamento para a vida que só se observa numa gente que tem o sangue da resistência na veia e no coração: “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”. Com o tempo, dou todas as razões para minha Nayla: é em Arcoverde, onde o meu tempo desacelera, que a felicidade se encontra nas pequenas coisas da vida.
É onde o meu coração encontra seu lugar, longe da correria do mundo. A vida é feita de batalhas, ninguém compreende melhor isso do que ela, mas nem por isso precisamos viver num campo de guerra. Se o nosso campo não planta, a cidade não janta. A colheita vem para quem tem a paciência de cultivar, que está na simplicidade do homem do campo, não entre os homens que guerreiam nos perímetros urbanos, no asfalto quente e de noites sem orvalho.
Melhor viver entre o canto dos pássaros e o vento nas árvores, com um luar na roça a contemplar até adormecer. Para mim, a natureza é inspiração, poesia em forma de paisagem, e o refúgio onde a alma encontra sossego. Se me pedirem para reduzir ao essencial a diferença entre o campo e a cidade, então aí está ela: o efeito que tem em nós uma sirene no horizonte. No campo, a sirene vem do canto dos pássaros.
É no Sertão, para os que não entendem a sua rica cultura que se instala no mato e brota nos roçados, que as abelhas fazem mel enquanto o sol brilha, onde o riso é um raio de sol da alma, onde as flores sempre tornam as pessoas melhores, mais felizes e mais prestativas. Luz do Sertão é alimento e remédio para a mente.
A força que vem de dentro da alma sertaneja de minha Nayla é a mesma que fez Cora Coralina transportar o seu Goiás para o nosso Sertão. “Eu sou aquela mulher a quem o tempo muito ensinou. Ensinou a amar a vida e não desistir da luta, recomeçar na derrota. Fiz a escalada da montanha da vida removendo pedras e plantando flores”.
O grande José de Alencar enxergou um Sertão de conflitos sociais e políticos. A paisagem árida é um elemento central na sua obra. A seca, a terra e a caatinga são elementos descritos e que moldam a vida de seus personagens. Mas a força do sertanejo se sobrepõe a tudo isso, até mesmo ao mundo imaginário de José Alencar, que viu que o sertanejo é antes de tudo um forte.
Forte porque não desiste nunca. Forte porque a sua força é maior do que qualquer estiagem. Forte porque o sertanejo planta com fé onde falta água, recomeça quantas vezes for preciso. É mais forte ainda porque é no chão rachado onde ele semeia o amor.
[arte: Eduardo Lima]



Publicar comentário