Tratado da coragem ardente: Quando dois se escolhem, o mundo arde em vão. Por Flávio Chaves

 Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc  –  Há forças na vida que não se explicam, apenas se reconhecem, como a chegada do vento que vira o rosto e bagunça o tempo. Quando dois se encontram com os olhos da alma e não apenas com a carne, forma-se um pacto invisível, desses que nem o próprio destino ousa contradizer. O amor, quando é chamado pelo nome verdadeiro, não se curva a obstáculos, não se esfarela diante da resistência, não se rende à inveja nem à opinião dos que não sabem o que é amar além da superfície.

É que o amor, quando é semente plantada em terra fértil, não espera permissão para crescer. Ele simplesmente cresce. Desafia a lógica, desobedece ao calendário, ri da geografia e, se preciso, passa por cima de tudo o que tenta impedi-lo de florescer. O que nasce entre dois que se querem com verdade é como chama sagrada: não se apaga com vento fraco, nem com a saliva ácida de quem não suporta ver acesa a luz que nunca pôde carregar.

O ser tomado de amor é um incendiário de emoções. Ele não pede licença para sentir, nem conselhos para seguir. Ele apenas vai, tomado de uma coragem quase mitológica, como se fosse Aquiles de peito aberto no campo de batalha — não para ferir, mas para não recuar. Quem ama com inteireza se transforma em campo de resistência contra a frieza do mundo. Traz nas mãos o manifesto da entrega, e no olhar, a faísca de quem não teme o confronto. E se alguém se atreve a atravessar esse caminho, encontrará não um casal apaixonado, mas uma força ancestral que não admite ser dobrada.

Há sempre quem tente impedir o voo de quem encontrou o céu no olhar do outro. Gente que não soube amar, que deixou escapar entre os dedos o que um dia talvez teve — ou achou que tinha. São esses, os que vivem à sombra do que poderia ter sido, que se armam de argumentos e pedras, tentando sabotar o que não compreendem. Mas esquecem que a filosofia mais pura do amor é simples: ninguém perde o que nunca teve, e ninguém segura o que nasceu para ser livre.

Quando dois se reconhecem com a alma em chamas, não há decreto, ciúme ou censura que os detenha. Se houver quem deseje erguer muros entre dois corações que já se reconhecem, o amor não guerreia — ele resiste. Não se defende com armas, mas com presença. Não impõe, apenas existe com tal intensidade que sua própria existência desarma qualquer tentativa de negação. Porque aquilo que é verdadeiro não precisa vencer: basta continuar sendo.

E se houver quem tente apagar esse incêndio, o tempo há de mostrar que fogo nascido do encontro verdadeiro não se desfaz com sopros. É calor que persiste, chama que se adapta ao vento e continua ardendo — não para consumir, mas para iluminar. Só os que habitam a grandeza do sentir compreendem: há brasas que nem o frio mais severo consegue extinguir.

Porque o amor, quando é coragem em estado puro, é também permanência. E diante disso, todo resto é silêncio.

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