Jô Mazzarolo, quando a palavra prolonga a vida do gesto. Por Flávio Chaves
Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc – Algumas figuras não precisam proclamar quem são. Impõem-se pela firmeza do caráter, pela coerência dos atos e pela forma como atravessam épocas sem se render a modismos ou alardes vãos. Jô Mazzarolo pertence a essa linhagem rara. Durante mais de duas décadas no comando do jornalismo da Globo em Recife, não apenas dirigiu uma redação: moldou um modo de pensar comunicação como serviço público, como espaço de encontro e como prática de dignidade. Em meio a tempos acelerados e superficiais, Jô semeava legado.
Agora, volta a oferecer-se ao público sob outra forma. Já não é apenas a gestora respeitada nem a jornalista de prestígio consolidado: é autora. E com a mesma delicadeza firme que sempre guiou sua trajetória, apresenta seu primeiro livro “Mude o Conceito – Quando inovar não era opção”. O título sintetiza o espírito da obra. Jô não narra apenas experiências, ela compartilha o itinerário íntimo de quem soube, em momentos decisivos, escolher caminhos diferentes quando a repetição seria mais confortável, recuar quando a imposição era tentadora, escutar quando muitos preferiam sobrepor a própria voz.
Os capítulos não obedecem à ordem cronológica das vitórias fáceis. São quadros de um percurso cheio de decisões arriscadas, de experiências transformadas em aprendizado, de intuições que se confirmaram com o tempo. Em lugar de receitas, ela oferece horizontes. No lugar de conclusões fechadas, convida à reflexão. Essa sempre foi a essência de sua liderança: olhar para além da superfície, respeitar a força coletiva, abrir espaço para que a mudança acontecesse sem estardalhaço, mas com consistência.
O lançamento em Recife, entre leitores, amigos e colegas, não foi espetáculo. Foi encontro com o calor e a ternura da escritora. Jô manteve-se fiel ao seu estilo: generosa, discreta, serena. Não havia a pose de quem busca aplauso, mas a naturalidade de quem compartilha uma parte íntima de si. A mesma mulher que conduziu o jornalismo nordestino com visão estratégica agora se deixa ler em outra dimensão, a da memória transformada em palavra, a da experiência decantada em literatura de vida.
A escritora que agora surge não rompe com a jornalista. É a mesma voz, em registro diferente. O livro não se propõe a eternizar feitos, mas a renovar sentidos. Em cada página, o leitor encontra a marca de uma mulher que sempre soube que inovar não é invenção momentânea: é atitude diante do mundo. O legado de Jô já estava firmado na história da televisão e na memória de tantos profissionais que com ela conviveram. Agora se prolonga em papel, com a vantagem de poder ser relido, anotado, guardado como se guarda algo que não se quer perder.
“Mude o Conceito” é mais do que uma lembrança de tempos de transformação. É um convite ao pensamento crítico e à coragem de rever certezas. É também a reafirmação de que o verdadeiro poder não se traduz em autoridade ruidosa, mas na capacidade de inspirar mudanças duradouras. Jô Mazzarolo continua, e continuará, porque tudo o que faz ecoa além do instante. E quando a palavra se alia a uma vida de escolhas firmes, o que se escreve deixa de ser registro: torna-se destino.
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